quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Ardido

Mixed media - acrylics on a collage of handmade and upcycled papers and old sheet music.:


Quantas letras já escrevi pra você?
Minhas letras não encaixam na sua música.
Achei um pedaço de papel rasgado
de uma carta que vc escreveu para mim.
Tem tantos anos isso...
Só sobrou uma frase,
mas eu guardei com muito carinho.
Foi o que sobrou de nós.
Não te vejo mais,
não sei mais como está seu corpo, seu rosto,
envelhecido provavelmente,
Aquela carta era de despedida,
e na frase dizia assim:
"Cuidado, dia de tudo véspera de nada".
Lembrei que vc se arrependia
por ter me deixado ir,
vc se lamentava e pedia outra chance.
Eu, já uma flor despedaçada,
sem cor e sem perfume, escolhi não perdoar.
Eu não me arrependo desse passo
mas sinto falta as vezes do que vivemos,
Você foi a pessoa mais intensa que já conheci.
Com você os dias nunca foram iguais,
Você é mesmo a metamorfose ambulante
em que se intitulava,
e escolhemos o nome Raul.
Você nunca foi meu sol e nem eu seu girassol,
mas, tínhamos um jardim que nunca deu flor
e uma plantação de pimentas, que sim
nos deram muitas colheitas.
Talvez você seja mesmo apimentado,
e nosso amor ardeu até o ultimo minuto,
Ainda arde quando lembro,
Ainda arde em mim e em você.
Mas faz mal, nos adoece,
e eu não posso nem cogitar a ideia
de uma pitada sequer,
por que me faz mal, me adoece.
Eu escrevi muitas canções para você.
Eu plantei muitas flores em nosso jardim falido,
só colhi duas, e essas estarão comigo para sempre,
para lembrar, para me fazer companhia
já que você prometeu nunca me deixar só,
Você cumpriu.
Eu sou grata.
Eu não danço mais conforme a música,
E você ainda arde no meu coração.
Dia de tudo, véspera de nada!

(Nanda Assis)


Um comentário:

Lucia disse...

Que lindo , menina! Me emocionei. Acho que o amor é assim mesmo para alguns...Para nós.
Algo tão dentro...Tão fora, que nunca saberemos se está dentro ou se está fora...E essa sensação de desconforto eterna, e essa dor, essa mágoa do construido desconstruído.